A primeira questão que me surgiu à cabeça ao pensar no assunto da saúde mental foi como nós, millenials/geração Z, como quisermos chamar, somos privilegiados em viver em uma época em que esse assunto está sendo abordado abertamente.
Vivemos hoje em um ritmo jamais vivido anteriormente. Precisamos de tudo instantaneamente, de respostas no mesmo segundo das perguntas, de contato imediato com quem estamos procurando. Somos uma geração que precisa acelerar até uma mensagem de voz no whatsapp para nos sentirmos mais produtivos.
O que vem acontecendo é que com tanta tecnologia, acabamos ficando a maior parte do dia conectados, recebendo notificações instantâneas de tudo que pode estar dependendo de nós. Para uma resposta, para um pedido, com família, fornecedores, chefes, todos. Além disso, ficamos ligados também em informações, situações e conteúdos inconscientemente manipulados para fazerem parte do nosso dia a dia. Toda essa conexão que criamos com o mundo vem trazendo um problema interno muito mais profundo: a desconexão com nós mesmos.
Como dizia o escritor francês, Guy Debord, vivemos em uma sociedade do espetáculo, em que “tudo que era vivido diretamente tornou-se uma representação”.
O conceito se aplica diretamente ao impacto/escala que as redes sociais têm nas nossas vidas hoje. Cada vez com mais ferramentas instantâneas, somos forçados a estar on-line 100% do tempo para não deixar passar nenhum conteúdo sem conseguirmos visualizá-lo. Além da cobrança instintiva de precisar mostrar ou até provar ao outro o que estamos fazendo com o nosso tempo.
Acompanhamos a vida dos outros por horas em nosso dia e ao mesmo tempo reclamamos que não temos tempo para fazer nada que queremos fazer. Esse “estar longe de nós mesmos”, de ter tempo para dedicar à aspectos da nossa identidade/essência nos torna vazios por dentro. O pior de tudo é que vivemos em um ciclo vicioso. Ao mesmo tempo que sabemos e reclamamos de estar desconectados com nos mesmos, vivendo praticamente a vida alheia, não tomamos nenhuma iniciativa que faça com que a gente resgate a nossa essência. Vemos isso como algo muito trabalhoso, que exige tempo e força de vontade e quando colocamos na balança sempre deixamos para depois.
O contexto que estamos vivendo há um ano e meio está diretamente relacionado ao “boom” recente da importância de discutir tal assunto. A pandemia reforçou em vários aspectos a importância da saúde mental, pois tivemos que nos adaptar de uma maneira que gerou gatilhos para muitas pessoas. Falta de convívio social, mudança de planos, expectativas não realizadas, convivência forçada, mudança de formato de trabalho, medo do vírus, notícias assustadoras, entre muitos outros, fizeram com que uma grande parcela da população desenvolvesse ou reforçasse algum tipo de condição mental.
A pandemia trouxe à tona algo que já deveria ter sido percebido há muito tempo. O mal do século são as doenças que afetam a nossa psique. Quantas vezes durante os últimos meses não ouvimos falar de ansiedade, depressão e burnout? Algo que há pouquíssimos anos, se visto, era como uma fraqueza.
A ansiedade apareceu sem distinção de raça, gênero, faixa etária ou origem. Ela apareceu para muitos, em momentos de medo e estresse, praticamente tomando conta da vida cotidiana. Pouco se entende sobre essa condição que repentinamente toma conta da nossa mente e consegue se traduzir em diversos sintomas físicos – taquicardia, insônia, dores no peito e ataques de pânico. Muitos passaram a lidar com a ansiedade mas não procurar ajuda, achando que é algo passageiro e quase que proibido de se sentir. É importante que essa condição seja normalizada e que seu tratamento esteja disponível a todos, sem medição do que é urgente e o que não é.
A respiração controlada e a meditação são duas ferramentas essenciais para combater, ou amenizar, os sintomas da ansiedade. São raros os momentos em que estamos presentes 100% no momento, portanto ao trazer de volta para onde estamos através dessas práticas, deixamos de sofrer com situações futuras. Além disso, é importante saber que isso é um assunto a ser tratado e deve ser levado aos profissionais.
Uma outra condição mental que representa bastante a geração e o momento atual é a Síndrome de Burnout: uma consequência de um desgaste físico e mental de um excesso de trabalho que temos visto crescer exponencialmente em casos nos últimos anos. Antes o excesso de trabalho era romantizado, os workaholics eram vistos como exemplo de esforço e sucesso, mas bastaram poucos anos para os efeitos dessa narrativa virem à tona. A nova geração passou a trabalhar mais do que viver, se cobrar mais do que parabenizar e tomar para si responsabilidades que não são suas. O mais preocupante é o fato da maioria das pessoas precisarem passar por episódios traumáticos para entenderem o que está acontecendo e forçarem uma desaceleração imediata em suas vidas.
Todas essas condições, que em casos mais severos podem levar à depressão, carregam uma urgência pois podem acabar com vidas. “Segundo uma estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS), 883 mil pessoas se matam no mundo a cada ano. É mais gente do que todos os mortos em guerras, vítimas de homicídios e desastres naturais” (Ler matéria completa)
Estudos complementares apontam que aproximadamente 97% dos casos de suicídio estão relacionados à questões mentais como essas abordadas anteriormente.
Em conclusão, sinto que estamos no meio do caminho. Por mais que o momento seja favorável para uma discussão em torno do assunto, ainda temos um extenso caminho a percorrer. Onde tabus precisam ser substituídos por informações de qualidade, aceitação e acolhimento.